Sunday 30 May 2010

Acupunctura e exercício



A acupunctura constitui o ramo terapêutico principal daquilo que, habitualmente, se designa por Medicina Tradicional Chinesa (MTC).
Nas últimas décadas têm surgido, na literatura científica, fortes evidências relacionadas com a eficácia do tratamento através da acupunctura em diferentes patologias, razão pela qual não pode mais ser ignorada pelos agentes da medicina dita ocidental. Com efeito, os resultados de investigações devidamente controladas consideraram que a acupunctura é uma forma de tratamento eficaz para várias afecções, nomeadamente a dor aguda e crónica, a hipertensão, a angina de peito, a cefaleia, a depressão, a asma brônquica, as náuseas e os vómitos pós-operatórios, a dor pós-operatória, a síndrome do túnel cárpico, a dismenorreia, a dor crónica pélvica e a disfunção motora após acidente vascular cerebral, entre outras.
Em reconhecimento da legitimidade crescente da acupunctura, nos Estados Unidos a Federal Drug Administration, em 1996, retirou as agulhas de acupunctura da categoria de "dispositivos médicos experimentais" e regulamentou a sua utilização. Posteriormente, em 1997, os National Institutes of Health realizaram uma conferência de consenso, com um painel de especialistas, para discutir as evidências científicas relacionadas com a acupunctura, tendo sido concluído que esta é um tratamento eficaz para várias afecções.
A acupunctura actua segundo mecanismos ainda não completamente elucidados. Entre estes, o mecanismo da analgesia (alívio da dor) - um dos principais efeitos da acupunctura, - está bem investigado e esclarecido, existindo literatura científica abundante sobre o assunto, factor que muito tem contribuído para a aceitação e integração da acupunctura à medicina convencional.
Os efeitos da acupunctura não se circunscrevem apenas ao sistema nervoso, uma vez que esta terapia produz, igualmente, a libertação de substâncias humorais, nomeadamente neurotransmissores, hormonas e outras substâncias químicas que circulam no sangue e no líquido céfaloraquidiano.
De facto, a acupunctura, à semelhança do que acontece com o exercício muscular, produz descargas rítmicas nas fibras nervosas, promovendo a libertação de neurotransmissores endógenos: substâncias importantes no controlo dos elementos da dor (sensoriais, afectivos e cognitivos).
Actualmente, a acupunctura é, cada vez mais, utilizada na medicina desportiva, por médicos e fisioterapeutas, como terapia alternativa no tratamento de contracturas musculares: uma das afecções mais frequentes em traumatologia desportiva. Com efeito, muitos desportistas apresentam frequentemente músculos com pontos dolorosos (pontos "gatilho"), que se apresentam encurtados devido a espasmo e contractura. Estes sintomas desaparecem, quando esses pontos são agulhados.
Foi proposto recentemente um modelo baseado na radiculopatia (neuropatia periférica que ocorre na raiz do nervo) como forma de explicar a acção da acupunctura através do seu efeito no sistema nervoso periférico (SNP).
Esta é uma abordagem mais contemporânea da acupunctura e em maior sintonia com os princípios neuroanatómicos da ciência médica actual. Segundo este modelo, essas várias condições, incluindo qualquer dor que acompanha um quadro clínico, melhoram quando a função normal se restabelece. Na sua perspectiva, a agulha é um simples instrumento, embora o único capaz, de ter acesso ao SNP para restaurar a função normal.
A acupunctura deve todas as suas possibilidades à agulha, o instrumento mais efectivo que existe para estimular o SNP, por meio dos receptores musculares. Um objectivo essencial do tratamento é promover o relaxamento dos músculos encurtados, efeito que a agulha consegue atingir com uma rapidez e precisão não vistos em nenhuma outra terapia. A agulha fina atravessa facilmente o tecido subcutâneo até chegar ao músculo, onde penetra afastando os tecidos e produzindo o mínimo de lesão.
Ao romper a membrana celular de fibras musculares individuais, produz mecanicamente uma breve explosão de potenciais de lesão, chamados de "actividade de inserção". A lesão que a agulha provoca também gera correntes duradouras (designadas de "correntes de lesão"), que são envolvidas na reparação e na regeneração ao longo de vários dias.
Deste modo, quando a agulha penetra num músculo encurtado, isso faz com que ele se relaxe, na maioria dos casos, em segundos ou minutos.
Paulo Santos - Professor Universitário

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